Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

O da Inês

A minha mãe fez anos sem querer

Nem sei por onde começar, uma vez que não queres receber mensagens de parabéns, ouvir falar em presentes e apagar velas nem pensar. A mim parece-me que queres voltar ao passado. Lembro-me de ti, volta e meia, atrás de mim de chinelo na mão. Pensava que tinhas um azar do caraças no que diz respeito à pontaria, raras as vezes me acertaste. Hoje tenho a certeza que falhavas de propósito. Recordo-me da Ana a correr atrás de mim pela casa a assustar-me, com caretas medonhas diga-se de passagem. Corri para ti a chorar e, no processo, bati no aquecedor do vosso quarto (teu e do pai). Não faço ideia da dor que senti ou quantos pontos levei. Vejo-te apenas a ti... a chorar muito. Lembraste dos jantares silenciosos nessa altura? Claro que não, não existiam. Eram pontapés de baixo da mesa, gritos, queixinhas e discussões que, geralmente, eram ganhas por mim. Afinal eu era a filha mais nova.

 

Nunca pensei dizer isto mas... também quero voltar a pertencer a esse quadro. Quero passar dias maravilhosos em casa dos avós e reviver uma infância que, apesar de tudo, não podia ter sido mais feliz e inocente. Quero correr pelas terras, roubar dióspiros das árvores, fugir das cobras, comer o arroz de farinheira da avó, desenhar o avô entre as motas e bicicletas e tomar banhos gelados no mar da Figueira da Foz. Ao final do dia continuava feliz porque era hora de voltar para casa e contar as minhas aventuras. As mais nojentas eram todas da Ana (ela merecia na época), as irresponsáveis para o pai (que nunca foi capaz de repreender os avós por me deixarem faltar à escola) e as divertidas eram e são todas tuas. Todas. Porque é assim que eu te vejo: uma mulher divertida, positiva, gira e meiga. Mesmo sem te esforçares.

 

Mãe, a verdade é esta. Uma parte de ti partiu recentemente, mas a vida continua. E tu tens de festejar os teus aniversários porque, efetivamente, estás de parabéns. Tiveste duas filhas, criaste-as, perdeste uma, manténs outra, recebeste dois netos e fizeste ao longo da tua vida uma imensidão de amigos que nunca se esquecem de ti. Por isso... PARABÉNS MÃE, mesmo que não te apeteça.

 

(Escrevi este texto à minha mãe em Dezembro do ano passado no seu aniversário, um mês depois da morte da minha irmã. Estas palavras eram só nossas, agora são vossas também. Bom fim de semana.)

mae.jpg

26 comentários

Comentar post

Pág. 1/2